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Covid-19 e Doenças Negligenciadas ante as desigualdades no Brasil: uma questão de desenvolvimento sustentável

RESUMO

A pandemia de Covid-19 tem levado os países periféricos, como o Brasil, a se confrontarem não apenas com novos desafios, mas com a exacerbação de tantos outros que sequer foram solucionados. Os inúmeros problemas decorrentes da pandemia atingem de maneira desigual a população tanto no que diz respeito ao acesso ao tratamento assistencial quanto às medidas para mitigar a contaminação. O presente artigo parte da hipótese de as profundas desigualdades sociais em saúde, associadas a fatores políticos e econômicos que perpassam a sociedade brasileira, integrarem condicionantes que poderão levar a Covid-19 ser incluída no grupo de Doenças Negligenciadas. Por meio de revisão de literatura não sistematizada, levanta as principais características referentes aos aspectos clínicos e às demandas ao sistema de proteção social brasileiro, analisando os pontos de contato entre ambas, tendo como base a matriz comum das desigualdades sociais. Acredita-se que os caminhos possíveis para que essa hipótese não se confirme será apostar na elaboração de políticas públicas com ênfase na solidariedade, nos direitos humanos, no fortalecimento da governança global e no agir ético de cada pessoa rumo ao desenvolvimento sustentável para todo o planeta.

PALAVRAS-CHAVE
Doenças Negligenciadas; Covid-19; Desigualdades; Determinantes Sociais da Saúde; Desenvolvimento sustentável

ABSTRACT

The COVID-19 pandemic has led underdeveloped countries, such as Brazil, to face not only new challenges, but the exacerbation of so many others that have not even been solved. The countless problems resulting from the pandemic affect the population in an unequal way, both with regard to access to care treatment and measures to mitigate contamination. This article starts from the hypothesis that the deep social inequalities in health, associated with political and economic factors that permeate Brazilian society, integrate conditions that could lead to COVID-19 becoming part of the group of Neglected Diseases. Through a non-systematic literature review, it raises the main characteristics related to the clinical aspects and the demands of the Brazilian social protection system, analyzing the points of contact between them, based on the common matrix of social inequalities. It is believed that the possible ways for this hypothesis not to be confirmed will be to invest in the elaboration of public policies with an emphasis on solidarity, human rights, the strengthening of global governance and the ethical action of each person towards sustainable development for the entire planet.

KEYWORDS
Neglected Diseases; COVID-19; Inequalities; Social Determinants of Health; Sustainable development

Introdução

A pandemia de Covid-19 tem provocado diversos impactos tanto na sociedade quanto na área da saúde, em particular, evidenciando uma crise sanitária que envolve os processos ambientais, econômicos, sociais, culturais e políticos e suas inextricáveis interdependências. Ela vem gerando importantes transformações e questionamentos no âmbito da organização da vida das pessoas, das famílias e dos diferentes grupos sociais, apontando necessidades imperiosas de mudanças de hábitos de consumo e de repensar a sustentabilidade do planeta11 Santos B de S. A cruel pedagogia do vírus. Coimbra: Editora Almedina; 2020..

Dados levantados na pesquisa Data Favela/Instituto Locomotiva22 Data Favela - Instituto Locomotiva. Pandemia na favela: a realidade de 14 milhões de favelado no combate ao novo coronavírus. 2020. [acesso em 2020 jun 2]. Disponível em: https://0ca2d2b9-e33b-402b-b217-591d514593c7.filesusr.com/ugd/eaab21_9837d312494442ceae8c11a751e2a06a.pdf.
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, realizada em 262 comunidades de todos os estados da federação e divulgada no início da pandemia, revelavam a preocupação dos moradores com o impacto na renda familiar por causa da interrupção da atividade econômica nessa parcela da sociedade que não tem poupança e nem recursos para manter seu padrão de vida caso não consigam trabalhar, tampouco possuem condições de cumprirem as recomendações da comunidade científica de distanciamento social. Corroborando essas preocupações, o mapa sobre as desigualdades socioterritoriais na cidade de São Paulo, publicado pela Rede Nossa São Paulo33 Rede Nossa São Paulo. Edição extraordinária do mapa da desigualdade indica CEP como fator de risco na pandemia. 2020 jun 24. [acesso em 2020 jul 1]. Disponível em: https://www.nossasaopaulo.org.br/2020/06/24/edicao-extraordinaria-do-mapa-da-desigualdade-indica-o-endereco-como-fator-de-risco-na-pan/.
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, já no final do primeiro semestre de 2020, apontava que nos distritos com melhores condições de vida, as mortes por Covid-19 crescem pouco e nos distritos onde as pessoas vivem menos tempo, encontram-se também piores condições de vida”33 Rede Nossa São Paulo. Edição extraordinária do mapa da desigualdade indica CEP como fator de risco na pandemia. 2020 jun 24. [acesso em 2020 jul 1]. Disponível em: https://www.nossasaopaulo.org.br/2020/06/24/edicao-extraordinaria-do-mapa-da-desigualdade-indica-o-endereco-como-fator-de-risco-na-pan/.
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, em que a mortalidade por essa causa está crescendo consideravelmente desde o começo da pandemia.

Outro ponto não menos importante, são as sequelas, que atualmente vêm sendo definidas como ‘Covid longo’44 Rajan S, Steves C, Mckee M, et al. In the wake of the pandemic preparing for long COVID. Copenhagen: WHO; 2021. [acesso em 2021 jan 5]. Disponível em: https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/339629/Policy-brief-39-1997-8073-eng.pdf.
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, as quais ocorrem não somente nos pacientes que desenvolvem a Covid-19 nas formas mais graves. Por ser uma doença que causa alterações multissistêmicas, afeta não apenas os pulmões, mas também pode gerar sequelas em vários órgãos e de diversos tipos e muitas vezes sobrepostos, provocando alterações no coração e nos rins, falta de força muscular, predisposição para trombose, disfunção cognitiva entre outras.

Estes dois grandes problemas – as desigualdades socioterritoriais e as sequelas – associados na presente pandemia geram muitas questões, entre elas a levantada por Hotez et al.55 Hotez PJ, Bottazziid ME, Singhid SK, et al. Will COVID-19 become the next neglected tropical disease? PLoS Neglected Tropical Diseases. 2020. [acesso em 2020 jun 10]. Disponível em: https://doi.org/10.1371/ journal.pntd.0008271.
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em seu artigo, escrito em um momento ainda inicial da Covid-19, quando esta ainda se encontrava com cerca de 1% de casos confirmados em países do Hemisfério Sul. No título em que abrem o manuscrito, os autores indagavam se a Covid-19, dada a sua rápida tendência de disseminação, poderia vir a ser a próxima doença tropical negligenciada. Naquele momento, já apontavam a baixa testagem e as dificuldades de acesso ao diagnóstico como um dos muitos componentes dos problemas dos sistemas de saúde de países pobres e/ou com grandes desigualdades sociais da África, Ásia e América Latina.

Em artigo posterior, já em 202166 Hotez PJ, Fenwick A, Molyneux D. The new COVID-19 poor and the neglected tropical diseases resurgence. Infect Dis Poverty. 2021. [acesso em 2021 fev 2]; 10(10):1-3. Disponível em: https://doi.org/10.1186/s40249-020-00784-2.
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, Hotez et al. sinalizam a profunda retração econômica global em função do avanço da pandemia e seus efeitos nefastos (diretos e indiretos) nos países pobres. Tais fatos, como tem sido exaustivamente apontado na mídia, estendem-se também aos países periféricos, como o Brasil. Contudo, ainda assim, pode-se indagar o que levaria a Covid-19 a se transformar em uma Doença Negligenciada (DN), já que ao contrário desta, possui grande visibilidade e o complexo sistema de inovação em saúde mundial está buscando abordagens científicas para seu controle?

Podem-se apontar algumas pistas para essa discussão: uma, relacionada com as sequelas dos pacientes, gerando ou agravando condições crônicas de saúde; e, outra mais profunda, ligada à pobreza e às desigualdades sociais em saúde, em que os problemas de acesso ao diagnóstico e tratamento em tempo oportuno, as dificuldades na prevenção e medidas higiênicas, na falta e/ou precariedade de moradias; na impossibilidade do distanciamento social e de seguirem o recomendado ‘fiquem em casa’, estratégia de confinamento da população adotada, no início da pandemia, para evitar a disseminação do vírus77 Schramm FR, Fortes P, Gomes A, et al. O aparente dilema implicado pela pandemia da COVID-19: salvar vidas ou a economia ? Rio de Janeiro: Fiocruz; 2020. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: https://portal.fiocruz.br/documento/o-aparente-dilema-implicado-pela-pandemia-da-covid-19-salvar-vidas-ou-economia.
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– entre outras dificuldades e iniquidades –, terminam por gerar, em um ciclo vicioso, a maior probabilidade de contaminação, desenvolvimento de sequelas, as quais aprofundam as imensas desigualdades estruturais especialmente nos países pobres e periféricos.

Este artigo, pois, versa sobre as correlações existentes entre a Covid-19, as DN e as desigualdades sociais, no Brasil. Ademais, tem como principal objetivo suscitar reflexões acerca dessas possíveis convergências e os seus efeitos sobre a população, no período de pandemia e pós-pandemia.

Destarte, a sua relevância se encontra na possibilidade de promover um debate sobre os possíveis impactos de um aprofundamento das iniquidades sociais da pobreza e da exclusão social, na saúde da população e, especialmente, estabelecer uma análise crítica a partir da hipótese de que um desses impactos se expressa na perspectiva de a Covid-19 se tornar uma DN.

Caminhos percorridos para análise do problema

Com o objetivo de obter uma visão ampla e global das publicações sobre desigualdades sociais, pobreza, DNs e políticas públicas na pandemia de Covid-19, realizou-se uma revisão não sistemática, do tipo narrativa, da literatura científica publicada sobre o tema das desigualdades sociais e seus impactos na saúde das populações vulnerabilizadas, com enfoque especial às DNs e à Covid-19. A busca eletrônica concentrou-se em artigos nas bases de dados: SciELO, Google acadêmico e Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), usando os seguintes descritores: ‘Covid-19’, ‘pobreza’, ‘desigualdades sociais’ e ‘doenças negligenciadas’. O período do levantamento bibliográfico contemplou a promulgação da Lei do Sistema Único de Saúde (8080/90)88 Brasil. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre a organização do SUS. Diário Oficial da União. 19 Set 1990. até o mês de julho de 2020. A partir do levantamento, realizou-se uma breve discussão teórica sobre os principais descritores, tendo como finalidade analisar a questão levantada sobre a possibilidade de a Covid-19 se transformar em uma DN. Este estudo faz parte da primeira etapa de pesquisa sobre o tema, cujos resultados serão apresentados em futuras publicações.

Identificou-se, quanto às determinações sociais do processo saúde-doença, uma crescente tendência para a realização de estudos que abordam as relações entre saúde e fatores histórico-sociais, econômicos, culturais e ambientais. A Comissão Nacional sobre os Determinantes Sociais da Saúde (CNDSS)99 Buss PM, Pellegrini Filho A. A Saúde e seus determinantes sociais. PHYSIS Rev Saúde Coletiva. 2007 [acesso em 2020 set 26]; 17(1):77-93. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0103-73312007000100006.
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(78), define-os como

fatores sociais, culturais, étnicos, raciais, psicológicos e comportamentais que influenciam a ocorrência de problemas de saúde e seus fatores de risco na população.

Desse modo, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), estão atrelados às condições em que determinada pessoa vive e/ou trabalha.

Nas últimas décadas, tanto na literatura nacional, como na internacional, observa-se um extraordinário avanço no estudo das relações entre a maneira como se organiza e se desenvolve uma determinada sociedade e a situação de saúde de sua população1010 Almeida C. Reforma de Sistemas de Saúde: tendências internacionais, modelos e resultados. In: Giovanella L, Scorel S, Lobato LVC, organizadoras. Políticas e Sistema de Saúde no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Fiocruz / CEBES; 2012.. Esse avanço é particularmente marcante no estudo das iniquidades em saúde, ou seja, daquelas desigualdades de saúde entre grupos populacionais que, além de sistemáticas e relevantes, são também evitáveis, injustas e desnecessárias1111 Whitehead M. The concepts and principles of equity and health. Int J Heal Serv. 1992; 2(3):429-45..

Conforme sinaliza relatório da Organização das Nações Unidas (ONU)1212 Organização das Nações Unidas. Overwiew. [data desconhecida] [acesso em 2020 jun 28]. Disponível em: https://unstats.un.org/sdgs/report/2020/Overview/.
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sobre a pandemia, o processo de gestão das crises sanitária, humanitária, econômica e social só poderá ser bem-sucedido com transparência e responsabilidade institucionais, além da responsividade inclusiva, participativa e representativa em todos os níveis. No Brasil, houve problemas com a divulgação de dados epidemiológicos, pelo Ministério da Saúde (MS), em 2020. Assim, a constituição do “Consórcio dos Veículos de Comunicação foi importante e necessária diante da falta de transparência das ações do governo federal”1313 Roncalli A, Lacerda JDS. Jornalismo como forma de conhecimento: a questão da divergência dos dados de tendência da COVID-19 divulgados pelo consórcio de imprensa e pela SESAP-RN. SciELO Prepr. 2020. [acesso em 2020 dez 4]. Disponível em: https://doi.org/10.1590/SciELOPreprints.1141.
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(9), contribuindo para a divulgação de casos e óbitos da Covid-19. Entretanto, segundo os autores, a forma como enunciam esses dados apresenta limitações que interferem na proposição de ações para lidar com a pandemia, no País1313 Roncalli A, Lacerda JDS. Jornalismo como forma de conhecimento: a questão da divergência dos dados de tendência da COVID-19 divulgados pelo consórcio de imprensa e pela SESAP-RN. SciELO Prepr. 2020. [acesso em 2020 dez 4]. Disponível em: https://doi.org/10.1590/SciELOPreprints.1141.
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.

Por fim, destaca-se o ‘negacionismo científico’ do governo federal, isto é, a “desconsideração explícita de questões que exigem um reconhecimento e validação científica”1414 Caponi S, Brzozowski FS, Hellmann F, et al. O uso político da cloroquina: COVID-19, negacionismo e neoliberalismo. Rev Bras Sociol. 2021 [acesso em 2021 fev 1]; 9(21):78-102. Disponível em: https://doi.org/10.20336/rbs.774.
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(81) propagando “falsas informações”1414 Caponi S, Brzozowski FS, Hellmann F, et al. O uso político da cloroquina: COVID-19, negacionismo e neoliberalismo. Rev Bras Sociol. 2021 [acesso em 2021 fev 1]; 9(21):78-102. Disponível em: https://doi.org/10.20336/rbs.774.
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(81). Mesmo se tratando de atuação específica do atual governo que pode ser reconfigurada futuramente, com gestões mais democráticas, o impacto da corrosão das políticas públicas, da credibilidade das instituições e informações possivelmente perdurará durante alguns anos, intensificando as iniquidades. Acredita-se, pois, que esses elementos contribuam para que a Covid-19 se torne uma DN.

A governança e os seus efeitos em tempos de pandemia

Ao Estado incumbe desempenhar determinadas funções na sociedade. Essas funções sofrem alterações, especialmente, para atender às mudanças nas necessidades humanas e nas relações sociais. Na contemporaneidade, uma das funções atribuídas ao Estado é a erradicação da pobreza e da marginalização, a redução das desigualdades sociais e regionais, bem como a promoção do bem de todos e todas, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, como se vê do art. 3º, incisos III e IV, da Constituição da República de 19881515 Brasil. Constituição, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal; 1988.. Para alcançar esses objetivos o Estado deve instituir e destinar políticas sociais para várias áreas, entre as quais, a da proteção social (trabalho, saúde, previdência e assistência). Lembre-se que políticas públicas podem ser definidas como:

[...] o conjunto de decisões e ações que o Estado projeta, implementa, monitora e avalia a partir de um processo permanente de inclusão, deliberação e efetiva participação social com o objetivo de proteger, promover, respeitar e garantir os direitos humanos de todos os indivíduos, grupos e coletividades que compõem a sociedade, sob os princípios da igualdade e não discriminação, universalidade, acesso à justiça, responsabilidade, transparência, transversalidade e intersetorialidade1616 Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Políticas públicas con enfoque de derechos humanos: aprobado por la Comisión Interamericana de Derechos Humanos el 15 de septiembre de 2018. 2018. [acesso em 2020 ago 8]. Disponível em: http://www.oas.org/es/cidh/informes/pdfs/PoliticasPublicasDDHH.pdf.
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(45).

Assim, os governos precisam instituir e destinar políticas sociais visando obter resultados em diversas áreas para, inclusive, promover o bem-estar dos integrantes da sociedade. Porém, um dos efeitos nefastos do encolhimento do Estado é o ataque às políticas sociais, inclusive, às de saúde1010 Almeida C. Reforma de Sistemas de Saúde: tendências internacionais, modelos e resultados. In: Giovanella L, Scorel S, Lobato LVC, organizadoras. Políticas e Sistema de Saúde no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Fiocruz / CEBES; 2012., aspecto que se torna ainda mais evidente, neste momento de pandemia.

Desde o início da pandemia, o governo federal criticou a premência de isolamento social sob a alegação que prejudicaria a economia, todavia, “pode-se dizer que o problema entre salvar vidas ou a economia é um falso dilema”77 Schramm FR, Fortes P, Gomes A, et al. O aparente dilema implicado pela pandemia da COVID-19: salvar vidas ou a economia ? Rio de Janeiro: Fiocruz; 2020. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: https://portal.fiocruz.br/documento/o-aparente-dilema-implicado-pela-pandemia-da-covid-19-salvar-vidas-ou-economia.
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(2). Além disso, sustentado por este ‘falso dilema’, o governo federal vem defendendo que

tratamentos milagrosos estão sendo utilizados como esperança de cura, ao mesmo tempo que servem como justificativa para não fechar estabelecimentos comerciais e outros setores da economia1414 Caponi S, Brzozowski FS, Hellmann F, et al. O uso político da cloroquina: COVID-19, negacionismo e neoliberalismo. Rev Bras Sociol. 2021 [acesso em 2021 fev 1]; 9(21):78-102. Disponível em: https://doi.org/10.20336/rbs.774.
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(91).

É preciso “dar apoio financeiro prioritariamente aos mais necessitados”77 Schramm FR, Fortes P, Gomes A, et al. O aparente dilema implicado pela pandemia da COVID-19: salvar vidas ou a economia ? Rio de Janeiro: Fiocruz; 2020. [acesso em 2021 jan 10]. Disponível em: https://portal.fiocruz.br/documento/o-aparente-dilema-implicado-pela-pandemia-da-covid-19-salvar-vidas-ou-economia.
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(2).

Assim, para minimizar o impacto da crise econômica sobre os grupos vulnerabilizados socialmente, criou-se o Auxílio Emergencial (A.E.), em 2020. Segundo, Marins et al.1717 Marins MT, Rodrigues MN, Silva JML, et al. Auxílio emergencial em tempos de pandemia. Rev Soc e Estado. 2021 [acesso em 2021 set 20]; 36(2):669-92. Disponível em: https://doi.org/10.1590/s0102-6992-202136020013.
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, o A.E. foi criado a contragosto do governo e sob pressão da sociedade civil, cujos percalços para a sua implantação foram: falta de transparência pública sobre as aprovações, reprovações e análises dos cadastros, as demoras em realizar as avaliações e a dificuldade em fazer com que o benefício chegue até as famílias1717 Marins MT, Rodrigues MN, Silva JML, et al. Auxílio emergencial em tempos de pandemia. Rev Soc e Estado. 2021 [acesso em 2021 set 20]; 36(2):669-92. Disponível em: https://doi.org/10.1590/s0102-6992-202136020013.
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.

Isso evidenciou o enorme desafio de “atender, com a urgência necessária e sem aglomerações, um número expressivo da população”1717 Marins MT, Rodrigues MN, Silva JML, et al. Auxílio emergencial em tempos de pandemia. Rev Soc e Estado. 2021 [acesso em 2021 set 20]; 36(2):669-92. Disponível em: https://doi.org/10.1590/s0102-6992-202136020013.
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(684). Enfim, trata-se de políticas públicas muito frágeis para lidar com esta enorme catástrofe sanitária.

Segundo Caponi1818 Caponi S. COVID-19 no Brasil: entre o negacionismo e a razão neoliberal. Estud Avançados. 2020 [acesso em 2020 nov 17]; 34(99):209-24. Disponível em: https://doi.org/10.1590/s0103-4014.2020.3499.013.
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(217),

[...] a epidemia nos coloca perante a debilidade dessa razão neoliberal centrada na meritocracia e no sucesso, na construção do Capital humano e do Capital-saúde (Bihr, 2020), onde cada um tem que criar seu próprio seguro de saúde e assumir seus próprios riscos sem nada dever ao Estado.

Assim, vem sendo observada uma ênfase em decisões políticas que privilegiam a economia em detrimento de interesses e necessidades de toda a coletividade, esvaziando projetos de políticas públicas intersetoriais passíveis de defrontar à pandemia.

A Covid-19 e seus desdobramentos no Brasil

Contrariamente à afirmação de que a Covid-19 seria uma ‘doença democrática’ pelo fato de atingir os países ricos no Hemisfério Norte assim como os demais países em desenvolvimento do Hemisfério Sul, a sua prevalência é mais elevada entre a população pobre, de maioria negra e moradora das favelas e comunidades periféricas gerando e perpetuando as desigualdades no Brasil, país de marcadas desigualdades socioterritoriais. Rita Barata1919 Barata RB. Como e por que as desigualdades sociais fazem mal à saúde? Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2009. [acesso em 2020 jul 18]. Disponível em: https://static.scielo.org/scielobooks/48z26/pdf/barata-9788575413913.pdf.
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(12) sinaliza que, ao se falar em desigualdade social, refere-se a situações que implicam algum grau de injustiça, na qual grupos são colocados “em desvantagem em relação à oportunidade de ser e se manter sadio”. E acrescenta:

[...] Toda e qualquer doença e sua distribuição populacional são produtos da organização social, não tendo sentido falar, portanto, em doenças sociais e não sociais1919 Barata RB. Como e por que as desigualdades sociais fazem mal à saúde? Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2009. [acesso em 2020 jul 18]. Disponível em: https://static.scielo.org/scielobooks/48z26/pdf/barata-9788575413913.pdf.
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(20).

De forma geral, compreende-se que o processo saúde doença é intrinsecamente histórico, isto é, “determinado pelas condições estruturais e conjunturais em que vivem as populações humanas”1919 Barata RB. Como e por que as desigualdades sociais fazem mal à saúde? Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2009. [acesso em 2020 jul 18]. Disponível em: https://static.scielo.org/scielobooks/48z26/pdf/barata-9788575413913.pdf.
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(20). As relações econômicas, sociais, culturais e políticas afetam a forma como as pessoas vivem, assim como o contexto ecológico, moldando os padrões de distribuição de doenças.

Os indivíduos infectados pelo vírus Sars-CoV-2, agente etiológico da Covid-19, podem cursar de forma assintomática ou sintomática leve à grave. Sujeitos sintomáticos apresentam inicialmente sintomas similares aos de gripe viral, como: febre, tosse, cefaleia, dispneia, diarreia, mialgia e fadiga. Além desses sintomas, o paciente pode apresentar anosmia e/ou ageusia2020 Abreu MRP, Tejeda JJG, Guach RAD. Características clínico-epidemiológicas de la COVID-19. Rev haban cienc méd. 2020 [acesso em 2020 jul 20]; 19(2):e_3254. Disponível em: http://www.revhabanera.sld.cu/index.php/rhab/article/view/3254/2505.
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. A maioria evolui com um bom prognóstico, no entanto alguns pacientes podem cursar com pneumonia viral leve e/ou progride para Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo (SDRA) com hipóxia, sepse e séptico2020 Abreu MRP, Tejeda JJG, Guach RAD. Características clínico-epidemiológicas de la COVID-19. Rev haban cienc méd. 2020 [acesso em 2020 jul 20]; 19(2):e_3254. Disponível em: http://www.revhabanera.sld.cu/index.php/rhab/article/view/3254/2505.
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, 2121 Kowalik MM, Trzonkowski P, Łasińska-Kowara M, et al. COVID-19 — Toward a comprehensive understanding of the disease. Cardiol J. 2020 [acesso em 2020 dez 4]; 27(2):99-114. Disponível em: https://doi.org/10.5603/CJ.a2020.0065.
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, 2222 Costa FA, Silva AS, Oliveira CBS, et al. COVID-19: seus impactos clínicos e psicológicos na população idosa. Brazilian J Dev. 2020 [acesso em 2020 dez 4]; 6(7):49811-4982. Disponível em: https://doi.org/10.34117/bjdv6n7.
https://doi.org/10.34117/bjdv6n7...
. Estudos demonstraram que pacientes idosos e/ou com comorbidade cardíaca, doença renal crônica e diabetes apresentam maior taxa de morbidade e letalidade2222 Costa FA, Silva AS, Oliveira CBS, et al. COVID-19: seus impactos clínicos e psicológicos na população idosa. Brazilian J Dev. 2020 [acesso em 2020 dez 4]; 6(7):49811-4982. Disponível em: https://doi.org/10.34117/bjdv6n7.
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, 2323 Wang X, Fang X, Cai Z, et al. Comorbid chronic diseases and acute organ injuries are strongly correlated with disease severity and mortality among COVID-19 patients: A systemic review and meta-analysis. Research. 2020 [acesso em 2020 jul 15]; eCollection 2020, 1-17. Disponível em: https://doi.org/10.34133/2020/2402961.
https://doi.org/10.34133/2020/2402961...
. Além de sintomas respiratórios, já foram descritos sintomas neurológicos graves como convulsões e acidente vascular cerebral isquêmico2424 Whittaker A, Anson M, Harky A. Neurological manifestations of COVID-19: A systematic review and current update. Acta Neurol Scand. 2020 [acesso em 2020 dez 4]; 142(1):14-22. Disponível em: https://doi.org/10.1111/ane.13266.
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. O comprometimento extrapulmonar está principalmente associado a alterações cardíacas e lesão renal2525 Xavier AR, Silva JS, Lacerda GS, et al. COVID-19 : manifestações clínicas e laboratoriais na infecção pelo novo coronavírus. J Bras Patol Med Lab. 2020 [acesso em 2021 jan 4]; (56):1-9. Disponível em: https://doi.org/10.5935/1676-2444.20200049.
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.

Um estudo baseado no seguimento de pacientes sobreviventes de Covid-19 demonstrou que 49,6% apresentaram um ou mais sintomas residuais da doença. Quase 50% dos sobreviventes manifestaram sintomas gerais como fadiga ou debilitação física, sudorese, calafrio, tontura, artralgia, mialgia e edema de membros. No entanto, 39% apresentaram sintomas respiratórios como polipneia, desconforto no peito, tosse, expectoração excessiva e dor de garganta. Todavia, 13% desenvolveram sintomas cardiovasculares, como hipertensão arterial, ruborização e aumento da taxa de infarto. Pouco menos de 20% relataram distúrbios do sono e 4,3% tiveram depressão. A alopecia foi um sintoma frequente em mulheres, tendo em vista que 48,5% apresentaram esse sintoma. Interessantemente, foi observado que os sobreviventes da Covid-19 são mais propensos a desenvolver sequelas clínica após três meses da alta hospitalar, denotando que esses sintomas podem ser comprometimentos após a fase aguda da infecção2626 Xiong Q, Xu M, Li J, et al. Clinical sequelae of COVID-19 survivors in Wuhan, China: A single-centre longitudinal study. Clin Microbiol Infect. 2020. [acesso em 2020 dez 4]. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.cmi.2020.09.023.
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.

Além do enfrentamento da pandemia, outro grande desafio será o monitoramento dos desfechos pós-infecção aguda nos sobreviventes, tendo em vista que pouco se sabe sobre os sintomas de médio e longo prazos. Faz-se necessário investigar todos os possíveis sintomas manifestados pós-Covid-19 a fim de acompanhar e tratar esses pacientes, além de coletar dados para definir melhor o impacto global da doença, constatar as necessidades clínicas específicas e desenhar um plano de cuidado integral e individualizado2727 Dourado P, Ramos A, Lima A, et al. Síndrome pós COVID-19. CONECTA-SUS Gerência Informações Estratégicas em Saúde, Governo do Estado Goiás. 2020 set 18 [acesso em 2020 dez 10]; 1-4. Disponível em: https://www.saude.go.gov.br/files//banner_coronavirus/protocolos-notas/S%C3%ADnteses%20de%20Evid%C3%AAncias/2020/S%C3%ADndrome%20P%C3%B3s%20COVID-19.pdf.
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. Um estudo com complicações respiratórias de prazo pós-Covid-19 sugere uma atenção primária pragmática e abrangente para identificar as lesões pulmonares e os sintomas complexos, bem como para encaminhar os pacientes para atenção secundária2727 Dourado P, Ramos A, Lima A, et al. Síndrome pós COVID-19. CONECTA-SUS Gerência Informações Estratégicas em Saúde, Governo do Estado Goiás. 2020 set 18 [acesso em 2020 dez 10]; 1-4. Disponível em: https://www.saude.go.gov.br/files//banner_coronavirus/protocolos-notas/S%C3%ADnteses%20de%20Evid%C3%AAncias/2020/S%C3%ADndrome%20P%C3%B3s%20COVID-19.pdf.
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,2828 Fraser E. Long term respiratory complications of COVID-19. BMJ. 2020 [acesso em 2020 dez 4]; 370:m3001. Disponível em: https://doi.org/10.1136/bmj.m3001.
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. Um trabalho elaborado por um grupo de estudo italiano, denominado ‘Gemelli against COVID-19 Post-Acute Care Study Group’, expressa a necessidade de uma abordagem multidisciplinar devido às manifestações clínicas sistêmicas pós-infecção2929 Gemelli A. COVID-19 Post-Acute Care Study Group. Post-COVID-19 global health strategies: the need for an interdisciplinary approach. Aging Clin Exp Res. 2020 [acesso em 2020 dez 4]; (32):1613-1620. Disponível em: https://doi.org/10.1007/s40520-020-01616-x.
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. Diante do exposto, faz-se necessária a implementação de estratégias de saúde pós-Covid-19 nos serviços de saúde de forma premente.

O MS, por sua vez, priorizou ações destinadas ao “cuidado individual de casos graves via criação de leitos de Unidades de Terapia Intensiva (UTI), hospitais de campanha [...]”3030 Giovanella L, Martufi V, Carolina D, et al. A contribuição da atenção primária à saúde na rede sus de enfrentamento à covid-19. Saúde debate. 2020 [acesso em 2021 jan 10]; 44(4):161-76. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0103-11042020E410.
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(162). Contudo, esses autores ressaltam a importância de associar essa atenção individual a um cuidado comunitário e territorial, por meio da Atenção Primária à Saúde (APS). A APS, especialmente a Estratégia de Saúde da Família (ESF), realiza ações de triagem, testagem, monitoramento, busca ativa etc., apresentando “papel decisivo na rede assistencial de cuidados, no controle da epidemia e na continuidade do cuidado”3030 Giovanella L, Martufi V, Carolina D, et al. A contribuição da atenção primária à saúde na rede sus de enfrentamento à covid-19. Saúde debate. 2020 [acesso em 2021 jan 10]; 44(4):161-76. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0103-11042020E410.
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(162).

Outrossim, são inúmeros os efeitos da pandemia sobre a saúde mental. O medo da doença e da morte ante a pandemia pode suscitar: depressão, ansiedade, síndrome de estresse pós-traumático, ideação suicida etc. É necessária uma atenção especial com os profissionais de saúde que atuam diretamente com pacientes contaminados por apresentarem maior risco de desenvolver problemas psicológicos e sofrimentos3131 Ho CSH, Chee CY, Ho RC. mental health strategies to combat the psychological impact of coronavirus disease 2019 (COVID-19) beyond paranoia and panic. Ann Acad Med Singap. 2020 [acesso em 2020 jul 15]; 49(3):155-160 Disponível em: https://annals.edu.sg/pdf/49VolNo3Mar2020/V49N3p155.pdf.
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. Esses impactos na saúde mental se encontram entrelaçados em marcadores de gênero, raça e classe social3232 Garrido RG, Rodrigues RC. Restrição de contato social e saúde mental na pandemia: possíveis impactos das condicionantes sociais. J Heal Biol Sci. 2020 [acesso em 2021 jan 10]; 8(1):1-9. Disponível em: http://dx.doi.org/10.12662/2317-3076jhbs.v8i1.3325.p1-9.2020.
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, os quais precisam ser considerados na elaboração de estratégias para promoção e prevenção da saúde mental.

Compreende-se que o aumento da má distribuição de riqueza aliado ao aumento do número de pessoas que passam fome, do desemprego e de outras formas de sofrimento social como resultado da pandemia, não devem ser vistos como sequelas, o que implica permanência e inevitabilidade. A pandemia de Covid-19 deve ser vista como um imperativo de mobilização para abordar os Determinantes Sociais da Saúde (DSS), de forma a evitar que essa doença alcance o status de negligenciada, um esforço que também permitirá abordar uma gestão mais bem-sucedida de outras DNs.

As Doenças Negligenciadas e a Covid-19

As DNs, até os anos 2000, eram denominadas ‘doenças tropicais’, termo que indicava uma concepção herdada do colonialismo, de um determinismo geográfico da causalidade de doença3333 Morel CM. Inovação em saúde e doenças negligenciadas. Cad. Saúde Pública. 2006 [acesso em 2020 nov 17]; 22(8):1522-1523. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/csp/v22n8/01.pdf.
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. A partir dessa década, a OMS e os Médicos sem Fronteiras propuseram novos termos: ‘doenças globais’ – como é o caso da Covid-19; DNs – em número de 17, incluindo tuberculose, raiva e hanseníase – e as ‘extremamente negligenciadas’ – entre elas, a leishmaniose visceral, passando a contemplar os contextos de desenvolvimento político, econômico e social. Valverde3434 Valverde R. Doenças Negligenciadas. Agência Fiocruz de Notícias. [data desconhecida] [acesso em 2020 abr 16]. Disponível em: https://agencia.fiocruz.br/doenças-negligenciadas.
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define as DNs como aquelas causadas por agentes infecciosos ou parasitas e consideradas endêmicas em populações de baixa renda. Essas enfermidades também apresentam indicadores inaceitáveis e investimentos reduzidos em pesquisas, produção de medicamentos e em seu controle.

Negligência, como sinaliza Rodrigues3535 Rodrigues CM. Sobre leptospirose e informação: ampliando os conceitos de negligência em saúde. Abcs Heal Sci Cs. 2017 [acesso em 2020 nov 11]; 42(1):45-49. Disponível em: https://doi.org/10.7322/abcshs.v42i1.949.
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(46), possui o significado de

falta de cuidado ou de diligência desleixo ou falta de aplicação e falta de atenção ou menosprezo em determinado contexto, situação, tarefa ou ocorrência.

Quando é utilizada em saúde, demonstra que não se trata de uma questão de falta de recursos financeiros ou falta de tratamentos disponíveis, mas as DNs significam que são ignoradas por aqueles que deveriam combatê-las – governo, sistema de saúde e indústria farmacêutica. Contudo, a negligência também diz respeito,

ao negligenciamento das populações correlacionadas à pobreza, desenvolvendo um círculo vicioso que acorrenta, pelo menos, um bilhão de pessoas em todo o planeta, segundo dados da OMS3535 Rodrigues CM. Sobre leptospirose e informação: ampliando os conceitos de negligência em saúde. Abcs Heal Sci Cs. 2017 [acesso em 2020 nov 11]; 42(1):45-49. Disponível em: https://doi.org/10.7322/abcshs.v42i1.949.
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(46).

Com a atual pandemia, há grande preocupação de que mesmo as DNs que tiveram avanços nas últimas décadas, como a hanseníase, retrocedam com a perda de recursos financeiros e humanos deslocados para o combate à Covid-193636 Cruz A. Para uma resposta à crise que garanta o direito à dignidade, é preciso elevar nossas vozes. In: Souza ACM, Pinto FF, Oliveira SHD, organizadores. Os ensinamentos da luta contra a hanseníase parao enfrentamento da covid-19. Cad. Morhan. 2019. [acesso em 2020 jul 20]. Disponível em: http://www.morhan.org.br/views/upload/JPGS_Morhan/imagens_site/CadMorhanCOVIDportuguesFINAL.pdf.
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. Essa é uma premissa significativa de ser considerada e por que não, compartilhadas suas variáveis para com o coronavírus, uma vez que a hanseníase, enquanto, DN, no Brasil, pertence às estatísticas da incidência com desempenho parecido com a Covid-19, ambas atingem em massa as pessoas das comunidades e periferias de densidade demográfica elevada e com ausência de saneamento básico, assim como as demais condições de salubridade3737 Boigny RN, Souza EA, Romanholo HSB, et al. Persistência da hanseníase em redes de convívio domiciliar: sobreposição de casos e vulnerabilidade em regiões endêmicas no Brasil. Cad. Saúde Pública. 2019 [acesso em 2020 nov 17]; 35(2). Disponível em: https://doi.org/10.1590/0102-311X00105318.
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. Questiona-se, portanto, como a sociedade brasileira vem cuidando dos sujeitos que a integram, ressaltando-se que os direitos de cidadania – civis, políticos e sociais – demandam a fruição de todos os outros direitos humanos.

Saúde pública e Covid-19: uma questão de desenvolvimento sustentável

Uma pandemia exige uma resposta também global, além das regionais, nacionais e locais, mesmo porque os seus impactos, incluídos aqueles para o futuro, são também globais, chamando a atenção para o fato de que a saúde não tem fronteiras disciplinares e nem do conhecimento. Ademais, por ser transdimensional, para a sua efetivação é necessário ações nas mais variadas áreas do conhecimento. O coronavírus também não tem fronteiras, e atinge, principalmente as classes menos favorecidas, conforme mencionado anteriormente.

Uma das possíveis respostas global à pandemia, que poderá evitar que a Covid-19 se torne uma DN, está nos objetivos e nas metas da Agenda 2030 da ONU para o Desenvolvimento Sustentável, tornando-se imperiosa a aceleração do seu cumprimento, destacando-se que hoje se vive um momento histórico de esgotamento dos recursos naturais e de emergência climática e ambiental em que o capitalismo mostra sua cara mais depredadora ou destruidora, além dos retrocessos democráticos e de direitos e de desconfiança e rejeição aos sistemas políticos, não esquecendo das enormes desigualdades sociais.

A Agenda 2030 é um plano de ação a ser colocado em execução pelos Estados, voltado à proteção das pessoas e do planeta, para acabar com a pobreza e a fome em todos os lugares, combater as desigualdades dentro e entre os países, construir sociedades pacíficas, justas e inclusivas, proteger os direitos humanos e promover a igualdade de gênero e o empoderamento de mulheres e meninas e assegurar a proteção duradoura do planeta e de seus recursos naturais. A Agenda 2030 visa, ainda, criar condições para um crescimento sustentável, inclusivo e economicamente sustentado, para a prosperidade compartilhada e o trabalho decente para todos3838 Organização das Nações Unidas. La extrema pobreza y los derechos humanos. A/75/181/Rev.1. 2020 out 7. [acesso em 2020 nov 10]. Disponível em: https://www.srpoverty.org/wp-content/uploads/2021/09/A_75_181_REV.1_S-ES.pdf.
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.

Anote-se que o direito ao desenvolvimento sustentável é multidimensional, na medida em que demanda o desenvolvimento social (não se admite desenvolvimento excludente), econômico (equilíbrio entre eficiência e equidade, isto é, balanço dos benefícios e dos custos diretos e indiretos), ambiental (direito das gerações atuais, sem prejuízo das futuras ao meio ambiente ecologicamente equilibrado), ético (bem-estar material e imaterial, individual e social) e jurídico-político (diz respeito à tutela do direito ao futuro), visando assegurar as condições favoráveis para o bem-estar das gerações presentes e futuras3939 Freitas J. Sustentabilidade: direito ao futuro. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum; 2012..

O enfrentamento da Covid-19 não é só uma questão biomédica. A solução da pandemia de Covid-19 envolve, principalmente, a questão ética que exige efetivar os direitos humanos – em especial para as pessoas pobres –, incorporar a equidade, a solidariedade, a responsabilidade e a transparência nas ações públicas e privadas. Isso significa que as pessoas pobres não podem suportar sozinhas os efeitos da pandemia até mesmo na forma de desinformação gerada por fake news, o que exige uma atuação responsável pelas autoridades públicas e particulares, inclusive para criar oportunidades para melhorar respostas para o enfrentamento das emergências surgidas durante e após este período.

Exige, ainda, conferir a máxima efetividade possível aos direitos humanos, que devem ser adotados como um código de conduta ética para pautar as relações entre Estados, entre Estados e seres humanos que estejam em seu território e entre particulares, lembrando-se, inclusive, que os direitos humanos – políticos, civis, econômicos, sociais, culturais e ambientais – formam uma unidade indivisível, interdependente e inter-relacionada que, se concretizados, poderão afastar os determinantes ou determináveis da saúde e, por consequência, possibilitar que todas as pessoas, inclusive as pobres, tenham saúde nos termos defendidos neste trabalho científico. Em tempos de pandemia, frise-se, os direitos humanos são ainda mais essenciais para todas as pessoas, inexistindo qualquer amparo legal para a sua suspensão neste momento.

O respeito, a proteção e a promoção da dignidade da pessoa humana, traduzidos pelos direitos humanos, constituem limites e tarefas do Estado e dos particulares. Limites da atividade do Estado, porque a dignidade não pode ser negada ou desconsiderada. A dignidade como tarefa do Estado diz respeito à exigência de direção de suas ações no sentido de conservá-la e criar condições que possibilitem o seu pleno exercício.

A extrema pobreza, foi definida pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU como sendo “a combinação da pobreza de recursos, pobreza de desenvolvimento humana e exclusão social”3838 Organização das Nações Unidas. La extrema pobreza y los derechos humanos. A/75/181/Rev.1. 2020 out 7. [acesso em 2020 nov 10]. Disponível em: https://www.srpoverty.org/wp-content/uploads/2021/09/A_75_181_REV.1_S-ES.pdf.
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(5), ressaltando-se que, se analisada sob o prisma dos direitos humanos, a pobreza é em si uma causa e uma consequência de violações desses direitos humanos e uma condição que possibilita a ocorrência de outras violações de direitos humanos.

Além da questão dos direitos humanos, a ética impõe que todas as informações relevantes acerca da pandemia de Covid-19 sejam compartilhadas com os seus interessados, inclusive para subsidiar a tomada de decisões democráticas que envolvam a vida e a saúde de todas as pessoas. Assim, a todos deve ser dado conhecimento sobre a saturação do sistema de saúde ou quando este estiver em vias de se saturar, sobre o acesso a respiradores, anestésicos, leitos hospitalares e vacinas e o alcance que imunização proporciona, por exemplo.

Não se pode esquecer, ainda, da relevância da vigilância, como mecanismo destinado a reduzir as incertezas que caracterizam a pandemia, o que exige também transparência sobre os “argumentos para as decisões de priorização, melhora a confiança pública, aumenta sua aceitabilidade e promove o cumprimento das recomendações”4040 Organización Panamericana de la Salud. Orientación ética sobre cuestiones planteadas por la pandemia del nuevo coronavirus (COVID-19). 2020 mar 16. [acesso em 2020 nov 10]. Disponível em: https://iris.paho.org/handle/10665.2/52142.
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(2) sanitárias. O sistema de saúde pública para o combate à Covid-19 demanda, além da parte médica, compromisso com a ética em vários aspectos, incluindo os programas de governança para um desenvolvimento sustentável democrático, que são medidas importantes para “enfrentar a possível desesperança distópica que está gerando nos mais vulneráveis”4141 Huotari P, Teivainen T. Gobernanza global y horizontes democráricos más allá del coronavirus. In: Bringel B, Pleyers G, organizadores. Alerta global: políticas, movimientos sociales y futuros en disputa en tiempos de pandemia. Buenos Aires: CLACSO; 2020. p. 75-84.(76).

Saúde pública, solidariedade e políticas públicas e sociais

O enfrentamento da Covid-19 exige restabelecer os laços de solidariedade que liga os seres humanos uns aos outros e aos não humanos. A solidariedade é peça-chave operacional de suma relevância das políticas públicas e sociais voltadas à proteção da saúde, observando-se, nesse sentido, que é no campo da saúde pública em que, talvez, o fator social da dependência mútua, da solidariedade humana, esteja em mais evidência4242 Laval C. Laval propõe: Saúde, Comum Global. Outras Palavras. Crise Civilizatória. 2020 ago 24. [acesso em 2021 jan 4]. Disponível em: https://outraspalavras.net/crise-civilizatoria/laval-propoe-saude-comum-global/.
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.

A solidariedade sanitária não pode ter fronteiras, demandando, entre outros, investimentos na saúde pública; a adoção de políticas públicas para o enfrentamento da Covid-19, dos determinantes e iniquidades da saúde e da pobreza, e a garantia de proteção social para todos os seres humanos, assegurando o acesso aos direitos inerentes ao trabalho humano e à seguridade social, que consiste em um complexo de direitos, composto pelos direitos à saúde, previdência social e assistência social (arts. 6º e 194 a 204 da Constituição da República de 1988)1515 Brasil. Constituição, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal; 1988.. E, destaca-se que, estar protegido significa “o embasamento de recursos e direitos que proporciona ao indivíduo moderno e que lhe permita converter-se em um membro da sociedade com direito próprio”4343 Castel R. El ascenso de las incertidumbres. Trabajo, protecciones, estatuto del individuo. Buenos Aires, Argentina: Fondo de Cultura Económica. Cuad Trab Soc. 2011 [acesso em 2020 mar 16]; (24):165-171. Disponível em: https://revistas.ucm.es/index.php/CUTS/article/view/36877/35691.
https://revistas.ucm.es/index.php/CUTS/a...
(189).

No entanto, o Brasil vem sofrendo retrocessos nesse sentido, ampliando ainda mais as desigualdades sociais. Basta ver, por exemplo, que, conforme Pesquisa de Orçamentos Familiares 2017-2018 – ‘Análise da Segurança Alimentar no Brasil’ –, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a insegurança alimentar grave, em que as pessoas relataram chegar a passar fome, atingiu 4,6% dos domicílios brasileiros, o equivalente a 3,1 milhões de lares. Esse percentual significa que 10,3 milhões de pessoas residem em domicílios nessa situação, sendo 7,7 milhões moradores na área urbana e 2,6 milhões na rural, valendo observar que a insegurança grave aparece quando os moradores passam por privação severa no consumo de alimentos, podendo chegar à fome. Acrescente-se que, em 2017-2018, dos 68,9 milhões de domicílios no Brasil, 36,7%, o equivalente a 25,3 milhões de lares, estavam com algum grau de insegurança alimentar: leve (24%, ou 16,4 milhões), moderada (8,1%, ou 5,6 milhões) ou grave (4,6%, ou 3,1 milhões)4444 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de orçamentos familiares 2017-2018: análise da segurança alimentar no Brasil. Rio de Janeiro: IBGE; 2020. [acesso em 2021 jan 14]. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101749.pdf.
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. Esse quadro diz respeito aos anos 2017 e 2018 e, certamente, foi seriamente afetado pela pandemia de Covid-19, não havendo como negar a sua estreita relação com o processo de desconstrução do sistema de proteção social brasileiro.

Cabe lembrar que proteção social possui relevante função social: primeiro, porque se trata de um valioso instrumento de combate à pobreza, às desigualdades sociais, exclusão e insegurança social, o que é, inclusive, reconhecido na Recomendação nº 202 da Organização Internacional do Trabalho (OIT)4545 Organização Internacional do Trabalho. Recomendação nº 202. [data desconhecida] [acesso em 2020 out 20]. Disponível em: https://www.ilo.org/dyn/normlex/en/f?p=NORMLEXPUB:12100:0::NO::P12100_INSTRUMENT_ID:3065524.
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; segundo, porque, ainda conforme a Recomendação citada, a seguridade social representa um investimento nas pessoas, os sistemas de seguridade social agem como estabilizadores sociais e econômicos automáticos, ajudam na transição para uma economia mais sustentável, a superar a pobreza extrema e redução das desigualdades e diferenças sociais dentro e entre regiões, na transição para o emprego formal e no estabelecimento de sistemas sustentáveis de seguridade social que se apoiem mutuamente.

Para a concretização da proteção integral, o Estado deve implementar um conjunto de ações, políticas, planos e programas a serem construídos com ampla participação e cooperação da sociedade, incluindo a internacional, envolvendo políticas públicas e sociais como uma mediação entre Estado e sociedade, com o desenvolvimento das estruturas de proteção social.

Considerações finais

A pandemia de Covid-19 expõe muitas das contradições e vulnerabilidades político-institucionais do Brasil: o esvaziamento de instâncias democráticas de participação social; as perdas no campo da proteção social e dos direitos trabalhistas em um momento em que as pessoas mais precisam de condições de subsistência; a redução dos investimentos no campo da saúde e retrocessos em políticas de saúde quando a população mais necessita de um sistema de saúde robusto; a negação da ciência e assim por diante.

Por isso, a hipótese deste estudo é de que, com o aumento das desigualdades sociais, a Covid-19 integre, de fato, o grupo das DNs. Tal consideração é, ainda, mais alarmante quando consideramos que, possivelmente, o advento de vacinas não será suficiente para a contenção do avanço da doença em todo o planeta, pois o direito humano à saúde demanda a fruição de todos os demais direitos humanos, quais sejam, civis, políticos, econômicos, sociais, culturais e ambientais, eliminando por completo a pobreza. É preciso, portanto, dissipar as brumas que envolvem as DNs, no Brasil, expondo suas causas e propondo caminhos que propiciem sair, da invisibilidade, aqueles que por elas são acometidos.

Desse modo, é importante fazer uma aposta na capacidade de respostas solidárias por parte da sociedade a partir de um maior engajamento de todos os seus setores, em especial dos movimentos sociais, na construção de políticas públicas e sociais capazes de reduzir as consequências nefastas da pandemia para a população brasileira.

Para além disso, acredita-se que, a fim de enfrentar uma pandemia de proporções gigantescas como esta que se está vivendo, inclusive, que não respeita fronteiras geossociopolítico-econômicas, será necessário que haja um fortalecimento dos organismos responsáveis pela governança global. As respostas à pandemia dependem muito do agir ético de cada pessoa, de grupos de pessoas, de autoridades públicas, da comunidade internacional rumo ao desenvolvimento sustentável para todo o planeta e em que ninguém seja deixado para trás.

  • Suporte financeiro: não houve
  • *
    Orcid (Open Researcher and Contributor ID).

Referências

  • 1
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  • 2
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  • 3
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    Dez 2021

Histórico

  • Recebido
    31 Mar 2021
  • Aceito
    23 Dez 2021
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